quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O SIGNO TEATRAL


Neste breve ensaio Umberto Eco coloca-se frente a ação teatral nas suas formas mais elementares, com o olho do semiólogo, para entender duas coisas:
os problemas que a própria existência de uma ação teatral elementar impõe ao estudioso da significação;
que problemas os estudiosos da significação elaboraram e esclareceram da maneira tal a ponto de poderem oferecer, indiretamente, sugestões úteis a quem se interesse por teatro.

Utiliza-se de uma situação teatral por excelência (Um homem bêbado, apresentado para demonstrar a necessidade da temperança) onde um ser humano é exposto com fins representativos. A sua representatividade não é a da representação teatral , é aquela pela qual um signo representa sempre alguma coisa a mais. Nota-se que o termo "representação" assume uma conotação ambígua sendo ele usado também para indicar um signo.

O teatro é também ficção, somente porque é, antes de mais nada, signo. Não podemos generalizar porque muitos signos não são ficções enquanto, pelo contrário, pretendem denotar coisas realmente existentes. Mas o signo teatral é fictício porque é um signo que finge não ser um signo!

Em síntese, o elemento primário de uma representação teatral; é dado pelo corpo humano que age (Executa uma ação dramática) assumindo "status" de coisa verdadeira, constituindo-se como signo incluindo ao mesmo tempo, como significantes, os movimentos que este executa e o espaço no qual se inscrevem.
Voltando á idéia do bêbado cambaleando, mesmo ele não falando, pode ser considerado como "Palavra" (Indubitavelmente o cambalear é signo, especificadamente índice, de uma ação precedente, é um significante cujo significado é homem bêbado). Esta situação elementar nos permite três tipos de observação:
não é necessária a intencionalidade na emissão do signo e, consequentemente, sua construção artificiosa mas é suficiente que exista uma convenção que nos permita interpretar uma certa situação como signo.

Todavia sendo que o signo foi emitido por alguém (o bêbado) isto nos leva a considera-lo verdadeiro como o fato que consideramos como obra de arte um objeto porque o encontramos em um museu (Ou pelo menos temos que admitir que foi produzido com esta intenção).

Que o nosso bêbado assume contemporaneamente vários significados alguns antipódicamente estruturados. Exemplificando: "Bêbado" ou "Homem bebendo" significa por excelência (antonomásia) "bebedeira", desenvolvendo a antonomásia em metonímia, ele conota "os perigos da intemperança"; e por antônimo elevado por sua vez a antonomásia e desenvolvido em metonímia , significa "as vantagens da temperança".
Porque, para que nosso bêbado signifique "homem bêbado" e, pela corrente retórica já dita, elogio à temperança", não é necessário que seja considerado em todas as suas características físicas. Será por exemplo irrelevante a cor dos cabelos, ou se vestir um paletó preto ao invés que cinza, mas será provavelmente relevante o fato de ele ter o não dentes podres ou extremamente bem cuidados. Um objeto, uma vez considerado signo, funciona como tal para alguns e só por algumas das suas características, não por outras, e, portanto constitui uma abstração, uma construção semiósica.

Imaginando que o bêbado assuma certos comportamentos: mova a língua, articule sons, diga palavras, mova-se em um espaço. Eis três campos de pesquisa semiótica:
A cinésica: esta estuda o significado dos gestos das expressões do rosto, das atitudes motoras, das posturas corporais: como cada um desses traços cinésticos é comunemente codificado.
A paralingüística: esta estuda as entonações, as inflexões de voz o significado diverso de um modo de pronuncia, não exista som emitido entre uma palavra e outra que não seja significativo.

A prossêmica: esta estuda as relações espaciais entre dois o mais seres e as suas implicações na alteração do significado diferencial.
Muitos autores e diretores de teatro utilizam estes modelos de comportamento comunicativo de forma instintiva podendo levar-nos a dizer que a contribuição da semiótica ao teatro é mínima; este descobre os próprios princípios sozinho e por natural e espontânea criatividade, e tanto melhor se o semiólogo lhe proporcionar, depois, ocasião para reflexão. Mas creio que, como a espontaneidade inventiva nutre a reflexão cientifica, também a reflexão cientifica pode potencializar a invenção.

ECO, Umberto. "O signo teatral"; In: Sobre os espelhos e outros
ensaios. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989. [pp. 11-44]

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