sexta-feira, 1 de maio de 2009

Rito: Linguagem Secreta, por Ivam Cabral

Toda a produção artística de Artaud é formada apenas de rastros, vestígios, secreções. Ele nos afirma que “o teatro é sempre um ato perigoso”, não somente lúdico. Assim, todo o seu trabalho tem a ver com a idéia do rito. Não como cópia, mas como entrega, como se quisesse fundar na cultura este comprometimento. Vivenciar esse “perigo” é reconquistar uma ciência. Mas é um processo sempre de desorganização porque os afetos, quando esta experiência é vivida em sua intensidade, são re-trabalhados.

Mas esta desorganização – que não é um surto nem uma experiência mística, antes um experimento científico – é sempre programada. Porque o teatro é a ciência que tem o artista como foco. E este artista deve saber transitar nesta desorganização. Porque para Artaud não existe diferença entre arte e vida.

Em “O Teatro de Serafim”, Artaud irá dizer que “teatro e ciência são uma coisa só”. Por isso, ao propor o ritual, ele estará propondo a fabricação de uma pessoa ao afirmar que “o teatro reconstrói o corpo”.

Em sua obra, Artaud vai concluir que o teatro fala de uma linguagem secreta e para chegar as suas questões, deve-se ser investigado. Para ele, o teatro é um campo de culturas que pesquisa uma linguagem perdida. Para isso, propõe a regressão, a volta às origens, colocando a cultura não apenas no âmbito estético, mas da sociedade. Analisa a criação e conclui que ela é um despedaçamento, a perda de algo.

Mas é necessário reinventar, no teatro, o ritual porque o ator tem o poder de ação sobre o espectador. Este ator não deve representar, mas experenciar. Só assim o fenômeno teatral é constituído como algo sagrado, vivo. Como um rito de passagem, uma instabilidade onde a identidade é dissolvida para depois ser reconstruída.

O rito abre uma outra relação com o tempo. Nele, esse tempo não é vivido de forma cronológica. Existe a idéia do eterno presente, um estado de suspensão. O ritual não tem necessariamente semelhanças com o ato cerimonial. Tem, sim, qualidade de ações: estar presente, inteiro, intenso.

O teatro deve superar o aspecto lúdico, apenas. É necessário que se chegue nos conflitos originários do ser humano, que estão congelados. E para se chegar até aí, devemos “desmontar o organismo”. Só isso.

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